Wednesday, June 28, 2006

Subjetividade

A Virgem Maria - Manuel Bandeira

"O oficial de registro civil, o coletor de impostos, o mordomo da Santa Casa e o administrador do cemitério de São João Batista

Cavaram com enxadas
Com pás
Com as unhas
Com os dentes
Cavaram uma cova mais funda que o meu suspiro de renûncia
Depois me botaram lá dentro
E puseram por cima
As Tábuas da Lei

Mas de lá de dentro do fundo da treva do chão da cova
Eu ouvia a vozinha da Virgem Maria
Dizer que fazia sol lá fora
Dizer i n s i s t e n t e m e n t e
Que fazia sol lá fora."

Me identifiquei com o poema. Sobrevivi a todos os enterros que tentaram promover para mim, à revelia. Antes eu atacaria em retorno os coveiros com suas próprias pás. Hoje não me importa. Podem enterrar e construir por cima a lápide, acreditando que estou no túmulo. Enterrem o que quiserem. Eu estarei bem distante.

Friday, June 16, 2006

Outra do Cream

Swlabr

Coming to me in the morning, leaving me at night.
Coming to me in the morning, leaving me alone.
You've got that rainbow feel but the rainbow has a beard.

Running to me a-cryin' when he throws you out.
Running to me a-cryin', on your own again.
You've got that pure feel, such good responses,
But the picture has a mustache.

You're coming to me with that soulful look on your face,
Coming looking like you've never ever done one wrong thing.

So many fantastic colors; I feel in a wonderland.
Many fantastic colors makes me feel so good.


Rock, psicodelia, Eric Clapton. Deu no Cream, um power trio, na verdade O power trio, com um som distinto de qualquer outra coisa que eu já ouvi. Formação: Jack Bruce (vocal/baixo), Ginger Baker (bateria) e, claro, Eric Clapton (segundo vocal/guitarra).

Cream

World of Pain

Outside my window is a tree.
Outside my window is a tree.
There only for me.
And it stands in the gray of the city,
No time for pity for the tree or me.

There is a world of pain
In the falling rain
Around me.

Is there a reason for today?
Is there a reason for today?
Do you remember?
I can hear all the cries of the city,
No time for pity for a growing tree.


Uma das maiores bandas de todas.

O Nome da Rosa

O Julgamento
O Mago
O Julgamento
O Eremita



(Apesar de ter achado o filme Código Da Vinci um saco, fiquei com algumas idéias na cabeça.)

Um enigma de esfinge pra uma egípcia.

Sonhos

Outro insight. Parece que meus sonhos vem sempre em 3, distanciados temporalmente entre si. Ontem liguei o cavalo ao cavaleiro e ao campo de futebol. Hoje lembrei de um outro sonho.

Estava eu e um colega conversando numas nuvens espessas, acima, bem acima de um estádio de futebol. Esse colega estava no sonho por ser um grande amigo, desses de pouco tempo mas significativos. Engraçado, minhas amizades de verdade acontecem no silêncio. Dispensam palavra ou conhecimento.

Ambos sabemos que há um monstro lá embaixo, algo que está matando as pessoas. A única coisa que mata pessoas, eu acho, é o tempo. Meu amigo me chama para ir lá embaixo, participar do jogo, e pula, caindo para baixo das nuvens. Eu fico sozinho, com medo, e não desço.

O de cima, superior à realidade, cheio de conhecimentos teóricos e sonhos de beleza num mundo sem tempo nem morte nem realização.

O de baixo, o menino mudo que anda com dificuldades, entrando em campo despreparado, armado apenas da própria teimosia e coragem, submetido à materialidade e a recusa de viver uma vida, se ela não for perfeita.

E o cavalo, veículo, vigor, força, livre mas batendo cabeça.

E o terceiro, ainda não anunciado. O resultado da soma dos 2, o cavaleiro imperfeito, mas real, corajoso e conectado a realidade, mas ligado à transcendência e ao Ser do mundo sem tempo.

O Ser que é, simplesmente, a totalidade de um sujeito.

Me veio outro sonho. Uma garota de quem eu gosto. Ela toca um piano com 3 teclas. As 3 teclas, em conjunto, são destacáveis do piano. Ela me mostra A,B ou C. Diz: "Quantas combinações dá pra fazer com isso?".

Mais outro. Meu analista, na janela do carro, me diz: "Lembre-se, o quadrado é perfeito, mas não é completo." E eu peço que ele me ajude, através da análise, para que eu me sinta mais inteiro.

Mas a análise não se presta a isso. A análise tem o fim de tornar a incompletude, a falta que define o ser humano, mais suportável. Diz Freud que queria tornar a miséria da vida humana em um sofrimento mais tolerável. Buda diz: toda vida é sofrimento. E o objetivo dele é o mesmo: lide com o sofrimento e torne-o possível.

O triângulo, me lembra triângulo amoroso e também a trindade. O quadradro, me lembra um ringue, a carta do Imperador e a idéia desta ser a única forma perfeita criada pelo homem.

Só através da batalha se construirá esse quadrado perfeito. Só no sangue. Familiar isso, não? Quantos mortos ao longo da história? Quanto sangue derramado para construir a cidade de deus?

Transmutar o Ego-Dragão para o Sábio-Dragão, equilíbrio de bicho que vive na terra e no céu, como Shiva, um pé sobre o anão da ignorância e o outro levantado, erguido no ar.

Ainda ouvindo Caetano Veloso:
Mora na filosofia... pra que rimar... amor com dor?

Por enquanto me falta o que escrever.

Veloso

If you hold a stone
hold in your hand
if you feel the weight
you'll understand

ou

Se você segurar uma pedra
segure-a na sua mão
se você sentir o peso
você vai entender.

Esse Caetano Veloso, meio sem querer, disse uma das coisas mais poéticas que já ouvi. Se você sente o peso da pedra não irá jogá-la em ninguém. Dai a idéia de pecado, essa invenção ridícula, perde completamente o valor. Não jogue a pedra, mas não por lhe faltar pecado. Mas por ter compaixão com quem levaria a pedra na cara.

Compaixão, que segundo o Milan Kundera, em A Insustentável Leveza do Ser (que teve versão cinematográfica, em que milagrosamente o filme é melhor que o livro) tem duas raizes: 1 - significando "se condoer" e 2, a mais fantástica, que compaixão (com + paixão) quer dizer "sentir com" ou partilhar sentimentos.

Eu que ia escrever sobre sonhos, acabei desviando no meio do caminho, ouvindo esse cd do Caetano, do tempo dele na Inglaterra. Tá entre as melhores coisas que já ouvi, esse álbum e o Transa. Virei fã dessa english fase. Um cara que consegue escrever em inglês, juntando com português e carregando nos sons brasileiros não pode ser menos que genial.

I wish to know things are getting better...better...beta...betânia...

She has given her soul to the devil and bought a flat by the sea.

(...)

You don't know me... bet you never get to know me... you don't now me at all... feel so lonely... the world is spinning round slowly... there's nothing you can show me from behind the wall... show me from behind the wall... why don't you show me from behind the wall?? Nasci lá na bahia de mucama com feitor... o meu pai dormia em cama... minha mãe no pisador...

yes, the worl is spinning round slowly. just about to stop. or maybe i'm getting used to it... i exist in the center... the eye of the whirllwind... so, probably, everything will continue it's way, spinning and spinning... until I cease to be. Ou não e eu saio do centro. O mundo vai pro centro e eu só orbito.

Wednesday, June 14, 2006

Sonhos

O sonho tem uma importância enorme para todas as sociedades, arcaicas ou modernas. Para os aborígenes, houve um tempo antes do tempo, o Dreamtime, ou Tempo do Sonho, quando os espíritos ancestrais caminhavam sobre a terra. Brahma, o deus criador Hindú, cria o mundo usando como matéria os sonhos de Vishnu, o deus que dorme. Para a psicanálise, os sonhos são construtos do inconsciente, formas de realizar desejos não realizados conscientemente, repetições de ações feitas durante a vigília ou mensagens codificadas.

É bem comum que, quando se sonha, não se compreenda o sonho. Substituições, metáforas e misturas de elementos são comuns na tecitura onírica. Os sonhos complexos, de primeira, parecem desconexos e sem sentido. Acontece de só se compreender uma ou outra peça e se compor uma idéia geral a partir dos fragmentos muito tempo depois. Essa forma de compreensão me surge como insight, uma consciência repentina aparentemente ilógica.

Num primeiro sonho, há meses, vi um cavalo marrom, de semblante tranquilo, preso numa gaiola de zoológico. Quando o vejo, choro e o sentimento é de reencontrar algo que tinha se perdido. Dois meninos, meio demônios, riem de mim.

No segundo sonho, aparece um menino, mudo, com dificuldade de andar, que sou eu. A mãe, como uma secretaria de executivo, fala por ele. Conversa com um fisioterapeuta, que é um ator de cinema que eu tinha visto no IR dias antes. "Ele não aceita andar de cadeira de rodas" diz ela. "Mas vai ter que usá-la, não tem jeito" diz ele.

Então vejo um cavalo branco, num campo de futebol, correndo para o gol, prestes a atingir uma das traves. Outras pessoas, banqueiros e apostadores, observam. O cavalo está livre e transmutado, mas vai bater a cabeça e se machucar inutilmente. O cavalo, símbolo de força, virilidade e direcionamento, está sem cavaleiro. Está abandonado.

De que serviria o cavalo contra o Dragão, sem São Jorge? Alguém deve carregar a lança e conduzir o cavalo, símbolo da força instintiva purificada, contra o Dragão, na visão católica um símbolo do ego devorador e da sombra que não foi integrada à consciência. O cavaleiro é, assim, a consciência que direciona a força primal. No tarô, O Carro, carta do arquétipo do herói

Mas o cavaleiro não aceita, no meu sonho, a incumbência. O menino se julga inadequado para conduzir tal força e se recusa a aceitar a realidade: ele não poderá ser um cavaleiro como os outros. Como a realidade é negada, o menino nunca vai crescer e se tornar homem. Se sagrar cavaleiro, direcionar a própria vida, que está parada.

Uma mensagem do inconsciente que me parece assim, clara. Aceitar a realidade, sentir a dor de um rito de passagem, transmutar-se e assumir de vez o cavalo.

Monday, June 12, 2006

Caçador de Mim

Por tanto amor, por tanta emoção
A vida me fez assim
Doce ou atroz, manso ou feroz
Eu caçador de mim

Preso a canções, entregue a paixões
Que nunca tiveram fim
Vou me encontrar longe do meu lugar
Eu caçador de mim

Nada a temer senão o correr da luta
Nada a fazer senão esquecer o medo
Abrir o peito a força, numa procura
Fugir as armadilhas da mata escura

Longe se vai sonhando demais
Mas onde se chega assim
Vou descobrir o que me faz sentir
Eu caçador de mim

A Morte

Ella no faltará a la cita.

Sunday, June 11, 2006

O Gigante

Ele era grande. Lembro direitinho. Eu achava que ele tinha uns bons metros de altura. Era quase uma árvore. Diziam que ele era bravo. Engraçado que, durante a minha vida toda, eu nunca tinha visto isso. Pra mim ele era uma árvore firme e simpática, algo como o Barbárvore. Quando eu era pequeno e o visitava lá em Oliveira. O que ficou na minha memória é o "quando eu era pequeno".

Quando eu era pequeno, ele gostava de ler revistinhas e uns livrinhos de faroeste, não lembro quais, mas garanto que havia um Tex entre elas. Eu achava que ele era o homem mais sábio de todos, manifestação arquetípica da experiência.

Quando eu era pequeno, ele me dizia que as sementes de girassol que ficava nas telas atrás da cozinha era comida pra passarinho. Que o girassol é que comandava o movimento do sol, numa mitologia bonita. Que o tomate pequeno era venenoso. Eu lembro também de Jornal Nacional, que ele assistia. Ou mesmo jornal impresso, que até os últimos dias ele costumava ler. Já quando eu não era tão pequeno, lembro dele cortando vara de marmelo pra eu e meu primo brincar de cai n'água, no carnaval.

Outra imagem, a mais triste que eu já vi. Meu avô, sentado numa cadeira, ao lado do caixão da minha avó. Muito triste, mas de uma beleza, de uma força incomensurável. O ser humano é belo nos grandes momentos, nesses momentos em que todo mundo é igual. Perante a morte treme mesmo quem acredita. Mas, depois do fim, havia sim um amor, continuava uma ligação forte entre os dois.

Hoje, meu avô morreu. Mesmo sabendo que ele não era tão gigante, afinal de contas, prefiro lembrar com olhos de vinte anos atrás. Os mortos, os nossos mortos, vivem é na memória.

Friday, June 09, 2006

Canto de Ossanha

"O homem que diz dou não dá
Porque quem dá mesmo não diz
O homem que diz vou não vai
Porque quando foi já não quis
O homem que diz sou não é
Porque quem é mesmo é não sou
O homem que diz estou não está
Porque ninguém está quando quer"

Sabia das coisas, esse Vinícius...

Tuesday, June 06, 2006

Só pra variar...

Eu não tenho filosofia.
Eu tenho sentidos.