Sunday, October 30, 2005

Mistério

Um sujeito calvo tem couro cabeludo?

Saturday, October 22, 2005

O Zen Fodismo

Do alto da montanha via-se, em cores várias, todo o mundo. Mais ao norte cresciam árvores verdejantes, tagarelando entre si, balançando ao sabor do vento. Ho Sushiman aprendera com o mestre a ouví-las. Subia da relva um cheiro de multiplicidades crescendo como crescem todas as coisas vivas. Ho Sushiman podia sentir seu odor, mesmo à longas distâncias, como faria Heimdall, o deus nórdico, que tinha seus sentidos incrivelmente apurados. Lá longe, uma jovem brincava, saltando e sorrindo, com sua saia de colegial dançando pelo ar, para cima e para baixo. Ho Sushiman aprendera com o mestre que não podia ver aquele tipo de coisa. Mas aquela era uma difícil provação e, insistindo em espiar, levou na cabeça uma caximbada do caximbo de bambú-rei do mestre. Sabiamente o mestre Pingo'Lin dizia: "somente quando você for um mestre e não uma jovem joaninha deslumbrada, poderá postar seus olhos sobre o corpo de uma garota." Ho Sushiman, com sua incrível visão, via agora um monge careca, despido de seu hábito fazendo cócegas no ventre da jovem. Então Pingo'Lin disse:
- Joaninha Deslumbrada - quando chamado daquela forma pela primeira vez pelo mestre, Ho Sushiman quis introduzir o caximbo de Pingo'Lin em algum lugar inóspito do velho - hoje aprenderá um novo mantra. Repita comigo...
- Sim, mestre...
- Eu...
- Eu...
- Sou...
- Sou...
- Foda...
- Foda...
- Muito bem, essa é a maior lição do Zen Fodismo... agora medite sobre o tema e me dê uma resposta à altura.
Um minuto de silêncio... Quando Pingo'Lin já se levantava, Ho Sushiman perguntou:
- Mas mestre, "eu sou foda" não é uma pergunta...
Pingo'Lin parou... pensou... terminou por dar uma caximbada em Ho Sushiman...
- Então me responda: "Eu sou foda?"
E Ho Sushiman se iluminou naquele momento.

Adorável família

Depois de acordar às 4 horas da manhã para preparar a viagem para o sítio, reunindo malas e organizando as coisas de forma que nada faltasse, após o preparo para um café com quatro crianças, a mãe finalmente chegava ao sítio. Às 10 horas, sentada na varanda, tinha acabado de ouvir um pedido: "mulé, trás uma cerveja". Era o marido tirando vantagem para os amigos. Ela gritou, educadamente, como sempre "vá se foder seu merda!!!" e ele sabia, era hora de tirar a bunda do sofá na frente da televisão, a patroa não estava para brincadeira. Ela continuou sentada, olhando a paisagem. Finalmente, em paz... ou nem tanto... lá de longe ela via um tufão caminhando em sua direção... eram 4 os diabos da tasmânia, já enlameados e gritando... "mamãe!!! mamãe!!!" gritava o coro em falsete-massacration. Muito animada, preferiu caminhar até eles. Muitas vezes seu instinto maternal pedia uma bacia de água fria bem grande e sem bóia, mas aquilo era moralmente feio, para não dizer o mínimo.

- mamãe!!! mamãe!!! que som a vaquinha faz??
- Muuuuuuuuuuu - ela dizia
- mamãe!!! mamãe!!! que som o porquinho faz??
- Oinc Oinc - repetia
- mamãe!!! mamãe!!! que som a galinha faz??
- Có có"
- mamãe!!! mamãe!!! o que aquele cavalo tá fazendo montado naquele outro cavalo??
- Arf, Arf.... quer dizer.... ele tá só tentando olhar por cima do muro, filho...
- mamãe!!! mamãe!!! porque o papai tá com o cavalo no cupinzeiro??
- Querido, por que você não vai lá perguntar a ele??
E lá se foi o saltitante menininho. Um a menos, ela pensava.
- mamãe!!! mamãe!!! que passarinho é aquele?
- É a rola, minha filha...
Parou e pensou um pouco... terminou dizendo:
- Por que vocês 3 também não vão lá falar com o papai?

Friday, October 21, 2005

Saturday, October 08, 2005

Manancial

Eleu nasceu num dia talvez como outro qualquer, quando por um truque do destino, construiu-se ao longo de dez anos, ganhando linguagem própria. Seu domínio era o inglês. Hábil aluno de si mesmo que era, descobriu-se no português e entendeu de seu universo que tinha mais posses do que acreditava possuir. Tinha brilho esse tal sujeito, mas tateava no escuro, procurando a saída do universo sem nome. Era também um doce revolucionário'm, líder da revolução da unidade, colando as peças do si mesmo, se descobrindo em maravilha. Dizer lhe dá mais e mais forças. Dizer sem dizer, sem pensar, apenas sendo e consequentemente agindo e daí falando não feito um tratado, analisado/estudado/elaborado, mas como um manancial do qual tudo jorra.

O Domador de Dragões

O centro olha. Direita e esquerda, destra e sinistra. Direito, o certo, lei e nuvem negra, amontoado de coisas, confusa porém infinitamente criativa, cheio de energia e inteligência, mas imóvel e apegado a seus tesouros. O Dragão sem nome. É a situação. À esquerda, o dito incorreto, independente e definido, o dom das palavras em ação. A cura pelos dizeres sinceros. Eleu é um nome perfeito, a fusão do que existe dentro e a evolução, que só se consegue ao olhar pela janela O furacão que se olha e o doce demônio que desafia e sorri. Então tudo se inverte. À direita o que não pode ser, o que é, mas vai mudar. O tesouro imóvel, de pés firmes no chão. E a esquerda o que transcende o certo e o errado. Tal coisa não há. As coisas tem a propriedade de ser por si mesmas. Eleu é o futuro, ele conduzirá o torvelinho a novas paisagens. Em pouco tempo, em boa linguagem de mineiro, o projeto do "para-i-só" se tornou inviável e indesejável. O furacão grita pelo genocídio, tem dentes em seu olho, gira em torno de si mesmo, sempre. Não tem nome próprio e portanto não parece contas nos murais da forma humana. O outro, quando chamam "Hei" ele responde. Eleu seu nome, o homem com a força de domar furacões. O domador de dragões e torvelinhos. O homem do impossível. Dono de um cavalo brando, um homem que olhou através da grade e se emocionou. Eu pensei que ele era o outro. Mas o outro sou apenas eu.

Eleu Riai

Quando acho que estou olhando para fora, descubro que olho para dentro. Como sempre, Eleu estava parado, observando. Tinha aquele olhar misterioso de quem pára e mira de perfil. Seu rosto, sempre um mistério. Uma imagem que vale por palavras. Eleu tem força, isto é claro. Olho-o, pensando. Wolverine ou Ciclope? O animal que sou é a sombra do sol ao meio-dia. Um dia Dragão, chocando eternamente tesouros. Outro dia Cavalo, poderoso e tranquilo, pronto para ser conduzido pelo cavaleiro. Eu brinco com o dragão e cavalgo o cavalo. Não há mais sinal do homem-outro. Há unidade. Na outra ponta o anti-herói, que é o herói da história, o caminho para a frente. É hora, sempre foi a hora. Eleu sempre esteve ali, me esperando. Era a roupa aguardando seu espírito. Eu que num sonho cometi um crime o cometi por assassinato para que do corpo, como na mitologia babilônica, em que o corpo de Tiamat é matéria do mundo, se fizesse algo novo. Parece ainda faltar algo. Meus ossos ainda não são de metal. Meu ouro ainda é o ouro vulgar. Futuro Xamã ou Alquimista? A fornalha cada vez mais quente prenuncia um futuro que sempre esteve lá. Vida longa, travessia de menino, coração de homem-cavalo-dragão.

O eu no outro


Então, o que sobra? Quando o que é certo parece assim tão errado que não se pode aceitar. Quando você na verdade questiona o que te faz feliz? Ela era morena, talvez a mulher mais bonita de toda minha vida. Fui apaixonado por ela. Em sonho, meu desejo de vê-la de volta à BH, mesmo depois do ponto final. Ela também gostava de mim. A conquistei exatamente como acredito hoje que as coisas devem ser. Naturalmente, ela passava ou aparecia no mesmo lugar que eu estava e eu sorria. Conquistei-a com um sorriso. Mas como eu poderia naquele tempo simplesmente aceitar, sem luta, sem teatro, sem ser quem realmente me julgava ser? Não. Eu não era o sujeito simpático que sorria, que dizia, que admirava, que se movia. Essa felicidade era só uma máscara, acreditava. Essa máscara era para os outros, esse terrível monstro mitológico que era esse tal Outro. Ser feliz parecia corresponder a cumprir o que esperavam de mim. Avesso a autoridade, isso era assim algo inaceitável. Fazer algo pelo outro, como consequência de ser feliz em si mesmo era apenas seguir o Dharma, a exigência social. Ela foi embora num dia que poderia ter sido perfeito. "Por que ele olha para mim?" O ele era eu. Não, eu não queria enxergar. Ela tinha um nome, Ana C. Estranho dar todo esse salto para admitir o que é certo para mim. Hora de olhar para o homem parado, de terno, homem da palavra. Sou eu. Tão claro mas tão triste. O tempo que poderia ter sido. Nas minhas mãos a capacidade de pintar um Renoir, cores de vida, mas pintei um atormentado Van Gogh. Pensei um dia, "sou narcisista"? Talvez quisesse, o narcisista cabe em si mesmo, se basta. Eu não me basto. Eu desejo o mundo.

Uma lenda. Havia o criador e ele percebeu que, por ter começo, teria fim. Temeu ser morto por alguém mas descobriu não haver ninguém para matá-lo. Então ele sentiu solidão, pois estava completamente sozinho. Criou assim, fruto de seu desejo, as coisas do mundo, incluindo homens e mulheres. Terminou por amar sua criação. Não criei nada, já está tudo ai, é só olhar.

A janela se abre.

Tuesday, October 04, 2005

As mil faces


Percebo hoje quào complexa é a minha (e acho que de todos) personalidade. Parece que o alvo mais vísivel é sempre um EU como instância consciente e prioritária em nossa paisagem mental. Que ele, soberano, reina acima de todos, como um imenso olho postado sobre uma torre de marfim. É estranho perceber que esse eu, no fundo, é uma parte apenas, não menos importante que outra, mas apenas o princípio da história.

Nunca entendi como era possível haver tantas "pessoas" diferentes dentro da minha cabeça. Não era possível, devia haver culpados e coisas a serem cortadas, pessoas a serem encarceradas, pois como no filme Highlander, só podia haver um.

Só começou a dar certo quando parei. Culpados? Incoerentes? Incorretos, pra não dizer errados? Bem? Mal? Não, somente partes a serem admitidas e assimiladas.

O Eu não é uma parte, não é aquilo que mais fácil e por mais tempo se identifica e fica presente. O Eu é um conjunto, uma totalidade reconhecida e construída. Existe como ato, como imagem, como palavra. Eu tenho muitas faces. Não me atrevo a dizer que outros as tem, quanto a isso só posso desconfiar, como bom mineiro. Será que Descartes tinha algo de mineiro?

Quando comecei a escrever esse texto estava mais inspirado.