Tuesday, December 27, 2005

O que eu acredito, parte 3

Nada de Novo no Front,
ou meus pensamentos sobre o Direito, o Estado e outros assuntos


Eu acredito na amoralidade da natureza e, considerando o homem parte dela, o vejo originalmente da mesma forma. O homem não é bom nem mal por natureza, ele é homem simplesmente. Quando alguém diz que o homem é mal ou bom por natureza, ao julgar suas ações, esquece que daí já está julgando algo que não tem valor moral por princípio.

Pois se assim fizesse, caberia que o julgamento fosse estendido à toda natureza, dizendo-se, por exemplo, que o leão é naturalmente mal, pois mata outro ser para sobreviver. E come os filhotes da fêmea que não são seus próprios filhos, ato que moralmente seria condenado.

Não advogo aqui, porém, o fim do Direito. Ao dizer que o homem não é bom nem mal por natureza, dou primazia portanto a escolha que ele tem nas próprias ações. Digo sim que não há algo como direito que emana da natureza, que poderia ser deduzido somente se se admitisse um julgamento moral dela.

As ações do homem são assim consideradas boas ou más não seguindo uma regra universal, como dizem as religiões cegas, incapazes de enxergar a realidade de suas bases, que não vem de deus em forma de escrituras, mas antes nasceram das sociedades em que se inseriam originalmente.

As ações de um sujeito são consideradas nocivas ou positivas quando colocadas num contexto social, pela necessidade de se manter em acordo um grupo de pessoas. A noção de bem e mal tem como base o efeito que uma ação tem no indivíduo e na sociedade.

Concordo que, coletivamente, deve-se determinar regras mínimas de convivência e civilidade, desde que se veja esse todo coletivo desprovido de personalidade, sem criação de vantagens personalizadas. Aqui entra a idéia de igualdade para todos, submetidos às mesmas regras.

No entanto, quando se pensa num sujeito individualmente, as noções e limites se tornam mais complicadas. Se o direito coletivo deve garantir a sobrevivência de todos e a inclusão de sujeitos na vida do trabalho, da justiça e no trato com o outro, não deve haver individualmente um julgamento das escolhas que um sujeito faz para si mesmo.

Nesse ponto venho a defender as escolhas individuais de crenças, pensamentos e expressões de idéias próprias, além do direito a coisas como o suicídio e o aborto, colocados à parte do poder coletivo de instituições. Defendo que a moral nesse ponto é desprezível, pois nada quer dizer. Aqui entra então a idéia de liberdade.

Certamente seria ridículo pensar que um indivíduo é uma ilha, que não sofre nem exerce influência no meio externo a ele. Que não sofre e exerce pressões sobre o que se tem por moral e imoral. No entanto, aqui está seu direito soberano a exercer essas influências, o que permite um caráter de trocas dinâmicas no interior da sociedade.

Nada de novo, apenas a estruturação dos meus pensamentos. Curioso escrever e se descobrir alinhado com os valores da sociedade, mas vou um pouco além.

Que novos direitos eu posso então defender? O casamento de homossexuais e a adoção de filhos por parte deles. A liberdade de ir e vir e o acesso ao trabalho das pessoas com deficiência. A liberdade de qualquer expressão, por pior que ela possa parecer.

No entanto, aqui poderia haver uma contradição. UM sujeito tem direito a agir contra outra pessoa motivada por crenças individuais em, por exemplo, superioridade da raça? Ele pode muito bem pensar o que quiser e mesmo se expressar dessa forma, mas de forma alguma impedir um negro, por exemplo, de trabalhar em sua própria empresa ou sequer cometer qualquer violência que fique caracterizada como crime.

Chego a outro ponto que me faz pensar. Entendo bem o que quer dizer direito igual para todos. Ainda que, como a maioria das pessoas, eu tenha ódio pessoal contra nazistas, e por menores que sejam esses grupos, eu não tenho o direito de agredí-los em seu direito de organização uma vez que eles se mantenham no campo das idéias.

Mas posso protestar e conduzir ações legais contra eles na medida em que, por exemplo, eu veja uma infiltração desses elementos no Estado, transformando idéias em, por exemplo, leis racistas, que valorizem um único grupo em detrimento de outros.

Uma segunda contradição que me faz pensar. Por exemplo, quando se determina que deve haver cotas de trabalho para pessoas com deficiência, se está favorecendo assim um grupo de pessoas. Dentro da lógica que sigo, isso fugiria dela?

Não. Pois se um dos princípios do direito coletivo e consequentemente do Estado que mantêm o direito, é garantir um acesso coletivo ao trabalho, e se essas condições não se produzem naturalmente, a lógica diz que deve haver uma intervenção de forma a manter a igualdade de condições.

Igualar condições não significa criar postos de trabalho que tolerem a ineficiência. Mas apenas criar as condições materiais para que todos possam produzir eficientemente e garantir rendas próprias, de forma a garantir a própria autonomia.

Nisso entra o que vi uma arquiteta dizendo sobre mudar o paradigma que se tem de deficiência. A deficiência não deve ser vista em sua dimensão estritamente médica, nem como atribuição exclusiva da pessoa com deficiência, o que a tornaria inútil e permitiria a segregação. A deficiência deve ser vista socialmente, como algo que surge na vida de uma pessoa na medida em que não se obedeceu o preceito de acessibilidade à estruturas.

Por exemplo, quando duas pessoas andam por uma rua calçada, uma a pé e a outra se utilizando de uma cadeira de rodas, elas se encontram em igualdade de condições e a deficiência não impede o desempenho das mesmas funções. No entanto, ambos decidindo ir para um restaurante e havendo escadas nesse recinto, surge a deficiência como elemento limitador. Não por uma característica inerente à deficiência, mas mais por falta de acesso físico.

Então fica ai a pergunta. É papel do Estado e do Direito compensar quando possível as desigualdades sociais? Claro, ainda dentro dos valores que determinam uma sociedade civilizada como uma que permite a participação de todos. Aqui está o princípio da diversidade. Tendo isso como princípio o verdadeiro problema será de que forma esse estado deverá intervir.

Essa forma de intervir tem que, obviamente, ser funcional e seu grau de funcionalidade será determinado, é claro, pelo ambiente em que tal ação tomará lugar.

O Estado nessa concepção é um organismo que funciona como apêndice e paralelo de um mundo externo, e que deve intervir o mínimo possível, mas sem deixar de cumprir certos princípios regulatórios e compensatórios. Não é papel dele, por exemplo, fazer revoluções, que, se surgirem, deverão acontecer de outras formas. E revoluções que venham a usurpar o Estado só se justificam caso o Estado tenha se enfraquecido e se torne ineficiente em seu papel e caso se possa colocar algo melhor e mais eficiente no lugar, tendo por base principios semelhantes.

Portanto, num mundo Capitalista, o Estado tem que compreender o mundo Capitalista e não se perder em sonhos que não sigam o mundo em seu estágio de existência atual. Portando o direito e o estado tem que analisar o mundo como ele é, dessa forma criando políticas e ações funcionais para cumprir seus princípios, como uma empresa que tem sua missão, baseada em princípios que por sua vez determinam os objetivos e as ações para cumprí-los de forma eficiente.

Ë simples, o Estado não se pode colocar acima de seus princípios nem se colocar acima do mundo, que por fim, tem suas estruturas que nasceram de forma espontânea. A arrogância de alguns partidos e governantes é notória, ao considerarem que tudo que nasce na sociedade é fruto da maldade a da distorção oriunda, por exemplo, de uma determinada ideologia. Isso é considerar todo o mundo ignorante e a totalidade de seus cidadãos como sujeitos completamentes desprovidos de personalidade e desejos próprios.

Num mundo como o nosso, a primeira coisa é garantir à todos o acesso as condições de vida que permitam que cada um tenha a própria autonomia material. O Estado, tendo ação sobre a matéria, e não a mundos metafísicos, deve portanto agir sobre as coisas materiais. Eu rejeito portanto governos fundamentalistas (orientais ou ocidentais) por serem incapazes de viver no mundo que se tem conhecimento.

Ter condições de subsistência significa ter renda, ter renda através do trabalho feito, salvo na incapacidade comprovada de desempenhá-lo. Qual trabalho será desempenhado passa pela escolha individual consciente. Trabalho que deve ser respeitado e tornado produtivo através do acesso de todos à educaçao, nos níveis adequados para cada atividade necessária. Creio que independente do que o sujeito faça, ele deve receber pelo menos um salário mínimo que garanta uma existência digna.

Não vejo porque não deva haver classes. Para mim pouco importa que as pessoas tenham classes econômicas diversas. O que é intragável é a brutal diferença que a gente abraça na sociedade, fruto não do esforço individual, uma última fuga daqueles que tentam justificar tais diferenças, mas das condições desiguais. Que ao menos fosse dado a todo mundo acesso à mesma base de educação e portas livres para trabalho, pois dai cada um definiria quanto de trabalho e de dinheiro seria necessário para si.

Seria ridículo dizer que trabalhos com características e graus de complexidade distintos devem ser remunerados igualmente. Claro que não, trabalhos devem ser remunerados de acordo com regras de mercado, obedecendo critérios de níveis técnicos exigidos e demandas. O papel do Estado é não permitir que tal remuneração individual ultrapasse um limite mínimo digno nem um máximo que subtraia de outros segmentos recursos importantes.

Trabalhos diferentes exigem níveis de educação diferentes. Uns menos, outros mais, ainda sim, de alguma forma úteis. Se o valor em dinheiro é diferente, não deveria porém haver valor moral diferente. Deve-se respeitar a pessoa e não o dinheiro que ela carrega no bolso. Qual a diferença entre um lixeiro e um banqueiro, como pessoas? Tanto um quanto o outro podem ser canalhas anti-éticos ou pessoas justas e honestas.

Pensar em educação e trabalho envolve uma grande quantidade de temas, como escolas, universidades, institutos de treinamento, crédito para desenvolvimento de empresas de todos os tamanhos, estudos sobre empreendedorismo e incentivo à criatividade individual, estudos sobre como lidar com dinheiro, ensino de valores como independência e autonomia, pensamento crítico, autoconhecimento e realização profissional, cidadania empresaria, responsabilidade social e terceiro setor, leis e regulamentos, comunicação interpessoal e relacionamentos, ética, criação de cenários, finanças, investimento, planejamento de longo prazo, acessibilidade e design universal, entre muitos outros temas.

(continua...)

Monday, December 26, 2005

O que eu acredito, parte 2

Acho que ideologias não fazem mais sentido, não do jeito que eu vejo estruturado em movimentos e partidos, como comunistas, socialistas e mesmo capitalistas. Burgueses e trabalhadores, ricos e pobres. Não sei mesmo se a idéia de esquerda faz sentido. Acho que não. Acho que muita gente se diz de esquerda por conveniência, por achar mais bonito dizer que é de esquerda. Por acreditar que a esquerda é a parte mais justa e libertária. Isso é uma imensa bobagem. Os valores de justiça, liberdade, autonomia e busca por felicidade não pertencem a ideologia nenhuma, existem por si mesmas.

Estruturalmente, pode-se dizer que o capitalismo venceu. Venceu como se tivesse havido uma guerra e o capitalismo, pai de todos os males, tivesse derrotado uma tendência boazinha e natural do ser humano.

Qualquer um que analisar a história, ir até antes da Grécia e Roma, vai perceber que o dinheiro, os mercados, o Estado e o capitalismo nasceram de forma espontânea. Nas atividades diárias de grupos diversos. Vale destacar que “espontâneo” e “natural” nada tem a ver com julgamento de valores. Para o bem ou mal, não existe um estágio de vida mais inocente a ser recuperado. Não há paraíso nem cristão nem anarquista a ser retomado.

O mundo seguiu o caminho que tinha que seguir e assim continuará sendo, independente do que se diga. As coisas se constroem com o tempo e o desenvolvimento do pensamento humano, e a participação individual do homem é mais um abraçar dos valores do tempo em que ele vive, que propriamente um agir revolucionário. O homem age dentro dos valores do próprio tempo e o que ele pode fazer é adiantar o devir, procurando descobrir que novos valores o mundo e o tempo virá pedir dele.

Quando eu digo isso quero dizer que sim, vivemos num mundo capitalista, mas afirmo também que esse capitalismo em si já de transformou. Quando a gente enxerga as tendências de responsabilidade social, por exemplo, que é basicamente a injeção de valores mais humanos na existência do capital, o que a gente vê na verdade é uma abertura.

O que eu percebo hoje é que abraçar o próprio tempo é necessário. Que teimar em agarrar-se a um passado é uma atitude profundamente anacrônica e além de tudo, pouco útil. Pouco faz para diminuir as diferenças sociais entre indivíduos, porque se permite atrasar ainda mais a promoção de melhorias para todos, pois tudo fica sempre para depois de uma eventual revolução.

O mundo é em parte uma realidade da qual não se pode escapar e em parte os valores que a gente injeta no mundo através de nossa ação cotidiana. Um híbrido entre o que temos disponível e a nossa força de promover o devir.

Creio hoje que é necessário diminuir as desigualdades. Pelo simples fato de haver gente que ainda morre de fome e não tem recursos para se manter com dignidade. E fico sim horrorizado quando ouço notícias de gente comprando bolsas de vinte mil reais, por considerar injusto. Creio que se um sujeito pobre pudesse viver bem, com condições dignas, a existência desses tão ricos não me incomodaria nem um pouco. A lógica é bem simples: se os recursos somam 100, se um cara tem 99, o outro necessariamente vai ter 1. Se 50 a 50 não é possível, então que pelo menos, em vez de 99, o sujeito rico tivesse 70, sobrando 30 pro outro.

O que é necessário é que esse sujeito que tem 0 ou só 1, tivesse um tanto mais para que pudesse viver de forma independente e digna. O que faz um sujeito ter recursos para viver? Acho que a resposta é simples: renda. E como ele obtem renda? Através de um trabalho qualificado e pago com justiça. E como ele consegue isso? Através da educação. Por fim, tem-se assim, a busca da solução através da geração de trabalho e renda.

Creio que, a princípio, deve-se estabelecer um sistema de ensino que transmita conhecimentos técnicos em faculdades e que prepare o jovem para trabalhar com um mundo mais pragmático. Que ele aprenda mais coisa que possa ser aplicada diretamente na realidade. Que ele aprenda a entender melhor as demandas profissionais do mundo, de forma a poder ter recursos para, num primeiro passo, resolver suas necessidades materiais.

Por que primeiro passo? Porque satisfeitas as necessidades básicas, de subsistência, de fundo material, o sujeito poderá partir para novas buscas. Resolvida a necessidade material básica, cada um estará livre para buscar os valores que realmente importam para sua vida individual. Promover mudanças e transmitir valores novos para as próximas gerações, num efeito multiplicador.

Está longe do mundo utópico perfeito, em que cada pessoa estará livre e terá conhecimento suficiente para escolher o próprio caminho. Em que a tecnologia será pensada antes de ser adotada num frisson estúpido. Em que cada sujeito poderá se voltar para si mesmo, tendo apoio de outras pessoas, na busca de seus próprios significados. Mas é o começo. É o rumo que o rio segue. É a forma como as coisas são, à parte do ressentimento contra um mundo que não tenha respondido às nossas expectativas.

Wednesday, December 21, 2005

Mote CAPETAlista de ano novo

"Dinheiro que é importante, Saúde a gente corre atrás."

Sunday, December 18, 2005

Boa notícia para o Ano Novo

Tem horas que eu paro, com um sorriso meio besta no rosto, percebendo a maravilha de mundo que a gente vive. Descobri com alegria que os níveis de violência, um mal tão terrível para a humanidade, caiu vertiginosamente desde o advento de nossa história, coisa que não é questão de opinião, mas sim, apoiada pela ciência dos números, a nossa bem vinda Estatística.

Pensar que no tempo áureo da matemática um inusitado sábio afirmava que através dos números se poderia chegar a Deus, pois esta era sua linguagem, prova disso foi a descoberta feita de que a escala musical obedecia regras matemáticas de proporção de tamanhos entre cordas. Esse era Pitágoras.

Na Cabala, na busca dos números na Torá, lá encontramos o Aleph, primeira letra, que é também o número 1, o uno, resultado da união de todas as outras letras (ou talvez eu esteja me fiando demais em Borges e no filme Pi.)

A propósito do filme Pi, vale a pena. Lá conhecemos um matemático que vê números em tudo, incluindo ai a proporção áurea, estudada por Leonardo, espalhados na arquitetura e no padrão de crescimento em espiral de certas plantas.

Mas vejo que estou saindo do assunto, mas eu não podia deixar de mostrar meus préstimos à sabedoria e o misticismo dos números, para embasar minha tese (que, por fim não é minha, mas gentilmente roubada de um amigo).

Nos primórdios, de cada 2 pessoas no mundo, 1 era assassina. Isso mesmo, 50% da população era então criminosa, mas não apenas por um crime qualquer, como assalto à mão armada (que seria um pouco difícil com uma pedra ou tacape, mas enfim), pois era o pior dos crimes: homicídio. A outra metade, portanto, seguindo a lógica, era vítima desse crime horrendo. Sim, é isso mesmo! Se 50% da população era de homicidas, a outra metade era de assassinados. Com esse fato demonstro também que a aplicação de penas conforme o direito passou por uma grande evolução. Naquele tempo, a única punição para um homicida era a destituição da moradia.

Devo deixar registrado meu maravilhamento. Desde os tempos de Caim e Abel, melhoramos infinitamente. Estatisticamente, acho que hoje nem 1% da população morre todos os anos.

Referências
Pi (filme)
O Homem de Vitrúvio (quadro)
O Aleph, conto de Jorge Luis Borges
Genesis (Banda... ops, quer dizer, Bíblia)

Saturday, December 17, 2005

Space Is Deep - Hawkwind

Space is dark, it is so endless, when you're lost it's so relentless
It is so big, it is so small, why does man try to act so tall,
Is this the reason deep in our minds.

It does not feel, it does not die, space is neither truth nor lie
Into the void we have to travel, to find the clue which will unravel
Is this the reason deep in our minds

The secret lies with our tomorrow, in each of us is a hidden sorrow
The path goes onward through the night beyond the realms ofancient light.
Is this the reason deep in our minds

O que eu acredito, parte 1

Eu sempre quis escrever um texto sobre minhas crenças, como uma forma de sistematizar a confusão que é a minha cabeça. Não o fiz por insegurança e por falta de autoconhecimento suficiente. Hoje, me sinto mais preparado e, além disso, pronto a observar em meu texto as incoerências e refletir com elas. Quando eu escrevo, sinto que estou escrevendo para um observador. O mais estranho é, conforme me confirmam os sonhos que ando tendo e insights que por vez ou outra acontecem, que o observador externo sou eu mesmo. Uma questão sempre importante para mim foi a relação entre eu e o mundo. Entre a individualidade e a coletividade, entre o ouvir e o dizer, as trocas entre pessoas e ambiente social. Nunca cheguei a um bom termo mas acabei descobrindo que o meio, o muro, em que vivo me encontrando, não é a divisa entre eu e o mundo, mas antes entre instâncias minhas, próprias. Para o bem ou para o mal, descobri a minha capacidade de viver bem sozinho, mesmo que o observador tenha um olhar estranho de reprovação a essa atitude. Curioso saber que tudo isso que eu digo não é certeza, é uma hipótese, ainda que apoiada na lógica e na experiência. Escrevo a que vim dizer nesse texto, mesmo que eu saiba que já estou dizendo desde a primeira linha.

Encontrei hoje uma música chamada "be yourself" do Hawkwind, de rock progressivo/vanguardista dos anos 70. Tenho ouvido uma segunda de mesmo titulo, do Audioslave. Aparentemente, esse imperativo do seja você mesmo, que eu entendia em agir de acordo com o que se sentia, sendo raiva ou alegria, só tem sentido no relaxamento. Ser eu mesmo só é possível deixando-se de lado grande parte dos complexos e das categorizações a que me submeto. Ser eu mesmo é quase uma coisa Zen, no sentido de se estar colocado no momento, sem barreiras no caminho. No meu caso, apesar de não ser um filósofo ou pensador do irracionalismo, é alinhar o pensamento com o desejo, apontar as setas para o mesmo lado.

Minhas neuras são mais comuns, creio, do que minha vaidade gostaria. Unicidade, ser único e totalmente individual. Ser percebido pelo outro, independente da forma, se bem ou mal, diferente então de agir para ser bem visto. De acordo com isso, ser percebido, ainda que ganhando uma pedrada como resposta. Necessidade de provar dignidade e capacidade, através de respostas sempre imediatas, pautadas normalmente pela agressividade. Marte era então meu deus mais importante, ávido por uma guerra, ávido por sentir o sangue correr. Via meu comportamento como o oposto disso, então sempre uma nova dose era necessária. Minha independência, nunca o suficiente, sempre alinhada com a necessidade de provar que eu não dependia de ninguém, considerando ai subjugar a dependênciá física, impossível dado meu dia a dia e minha cadeira de rodas. Antes morrer que estender a mão. Hoje é engraçado perceber que ela é mais que suficiente, tanto que acabei ficando dependente do ideal de independência. Fundamentos de um viver individualmente.

Partes constituintes, boas e ruins. Agressividade vem bem à mão se bem empregada, principalmente para aplicar bons sustos didáticos. Independência que manteve minhas capacidades de investigar e procurar as coisas com meus olhos, num casamento da Dama da Liberdade, do quadro de Delacroix sobre a revolução francesa, com São Tomé. QUe me deu um jeito próprio de ver as coisas. Que me fez perceber que trivialidade demais cansa. Que me fez ver e derrotar a minha necessidade de julgamentos, geralmente descidos como raios sobre eu mesmo.

QUe me permitiu estar fora de certas regras tidas como comuns. Acredito que, tudo que é possível, faz parte do mundo e dai é natural. Natural sem julgamento moral, pois assim por fim é a realidade, a parte de conceitos. Por exemplo, que homens e mulheres tem os mesmos desejos e que não existem papéis determinados a priori. Nem todos são caçadores, nem todas são gazelas prontas a serem abatidas. Admiro assim as mulheres livres, muitas vezes taxadas por julgamentos hipócritas. Acredito em todas as possibilidades de relacionamento, fora da monogamia, dentro da poligamia, poliandria, casamento em grupos e etc. Tudo é possível quando a gente pensa na variedade de pessoas que existe por ai. Não há imperativo biológico na determinação de sexos e toda a miríade que parte da heterossexualidade à homossexualidade é possível, dependendo apenas dos desejos de cada um. Sem certo ou errado, obedecendo o preceiro de que, se algo é possível na natureza, logo é natural. Admiro um mundo que talvez um dia se construa nas diferenças individuais e no entendimento que não há melhor ou pior, desde que não se cometa um crime deliberado contra alguém.

Acredito que as ideologias estão mortas, que revoluções levam à mera transferência de propriedade, e que as consciências, de forma geral avançam. Não por causa de um deus e não numa evolução dentro da estúpida lógica racionalista ou metafísica, mas por que o tempo passa e o arcabouço de possibilidades para o espírito do mundo se amplia. Caso não haja evolução da maioria, pelo menos individualmente ou em pequenos grupos isso é perfeitamente possível, bastando empenho em, talvez, sair do campo de conhecimento da realidade cotidiana e imediata. O mundo é esse e não outro. Pretendo trabalhar para aumentar minha capacidade e meu poder de construir a minha realidade, com ou sem outras pessoas. Paro por aqui, por enquanto (continua...)

Friday, December 16, 2005

O Ferdinando

"It's always better on holiday
It's so much better on holiday
That's why we only work when we need the money."

E não é que tem seu fundo de verdade?

Uma das bandas que confirmam que tem muita música boa ainda. Franz Ferdinand. A história deles é fantástica. Um grupo de artistas que decidiu fazer música e montaram a banda. A idéia: "make good music that girls can dance". Realmente, um lado forte de rock com uma ótima levada dançante. Continuando. Sei que eles invadiram uma casa velha ou algo assim e começaram a fazer shows e festas lá, com participação ainda de artistas plásticos e outras coisas do gênero. Fechados pela polícia, foram invadir outro lugar. Talvez seja tudo história, uma saída poética, mas dá vontade de acreditar. O nome, pra quem ainda não ligou as coisas, é o mesmo nome do príncipe morto na bavária, Ferdinando, estopim para o estouro da primeira guerra mundial.

Outra banda que faz uma união fantástica entre rock e dance é o Theatre of Tragedy. Não é bem rock, é um heavy metal com levadas eletrônicas, muito bom. O nome do álbum: Assembly.

Tuesday, December 06, 2005

Espírito Natalino III

Frase de natal:

"Nesse Natal, em vez de agarrar o saco do bom velhinho, puxe o do seu chefe!"

Espírito Natalino II

"Querido Papai Noel,

Nesse ano não quero presente... mas se você puder me transformar na rena do nariz vermelho, eu ficaria bem feliz de dar umas voltas com o senhor... se é que me entende. ;)

Ass: a rapozinha cruzeirense."

Espírito Natalino I

"Ho, Ho, Ho O CARALHO!!! Meu nome é Zé Pequeno!!!"

Sunday, December 04, 2005

Achado

As vezes me deparo com algumas surpresas totalmente agradáveis, e, na melhor acepção da palavra, completamente inesperadas, sem que haja qualquer sinal ou cheiro que as preceda. Na última semana, ouvindo um cd chamado “Celtic Dreams”, do grupo “Celtic Spirit”, encontrei num medley a maravilhosa música tema do filme “O Último dos Moicanos”.

Certas músicas, especialmente algumas de sinfonia, tem uma grandiosidade e heroísmo que submetem a quem ouve a um deslocamento. A realidade ordinária muda, ganhando repentinamente novos tons, crescendo em amplitude e profundidade, submetendo o pensamento a um segundo plano. A palavra em inglês que a descreve é overhelming, que quer dizer aqueles sentimentos para os quais não temos palavras capazes de minimamente descrevê-los.

Para aqueles que, como eu, buscam a beleza do mundo, esse arrebatamento é o melhor sentimento que se pode ter. Uma experiência sem interferências, pura como poucas, que revela a realidade e mostra o caminho da minha vida. Nas palavras de Joseph Campbell, o único perigo de se perseguir a própria bem-aventurança é ser bem sucedido.

Friday, December 02, 2005

Stray Cat Strut

Black and Orange stray cats sittin' on a fence
Ain't got enough dough to pay the rent
I'm flat broke but I don't care
I strut right by with my tail in the air

Stray cat strut, I'm a crazy cat
I'm a feline casanova, hey man that's that
Got a shoe thrown at me by a mean old man
Get my dinner from a garbage can

I don't bother chasin' mice around, Oh no
I slink down the alley lookin' for a fight
Howlin' to the moonlight on a hot summer's night

I sing the blues while the lady cats cry
Wow, stray catty you're a real gone guy

I wish I could be so carefree and wild
But I got cat class and I got cat style


Entre as minhas preferidas, já ouvi 2 versões, uma mais Jazz e outra meio Rock antigo.

Where is my mind???

Ooh, stop.

With your feet on the air and your head on the ground,
Try this trick and spin it, (yeah) yeah,
Your head will collapse but there’s nothing in it,
And you’ll ask yourself:
“Where is my mind?”

Way out in the water,
See it swimming?

I was swimming in the Caribbean,
Animals were hiding behind the rocks,
Except the little fish,
But they told me this is where it’s gonna talk to me honeybunny:
“Where is my mind?”

Way out in the water,
See it swimming?

With your feet on the air and your head on the ground,
Try this trick and spin it, yeah,
Your head will collapse but there’s nothing in it,
And you’ll ask yourself:
“Where is my mind?”

Way out in the water
See it swimming?


Where is My mind - Pixies

Ditado

A minissaia termina onde a imaginação começa.

Via de regra

Gente = Encheção de Saco

Temperamental

Vai ver que essa palavra me descreve bem. Vamos ao Aurélio.

[De temperamento + -al1.] Adjetivo de dois gêneros. 1.Relativo a temperamento. 2.De caráter instável, emotivo. 3.Diz-se de quem reage seguindo tão-só os impulsos de seu temperamento. Substantivo de dois gêneros. 4.Pessoa temperamental.

Vi um dia um sujeito, americano de nascimento mas budista de escolha, que dizia ter aprendido a observar a mente. Que a mente tem estados diversos, inclusive o do mau-humor, coisa que sinto agora. Que podemos nos distanciar dessas emoções, nos colocando um pouco à distância e fazendo a única coisa possível: esperar passar, como uma nuvem de chuva. Mas ainda não abracei o papo do “to be yourself is all that you can do”, que é muito bonito, muito interessante, muito chique, em bom francês do Existencialismo. Que é ótimo, quando você se sente no melhor dos estados, no lado claro da lua e não no outro.

Fico pensando, será que a gente pode mudar algumas características da nossa personalidade, ou isso é só uma fuga? Um eterno sair correndo das coisas, um devir com duas boas pernas de atleta para correr? Fico pensando que nisso, os budistas estão certos. Eles pregam a aceitação total do mundo. Longe dos livros de auto-ajuda, o que eles pensam revelam que deve-se aceitar inclusive os males, as partes não tão boas nem lá muito sociáveis.

Pessoas são diferentes. Algumas tem reações despertadas pelo mundo exterior a elas. Outras, como eu, estão voltadas para si mesmas, e seus humores tem mais a ver com seu mundo interior que o mundo de fora. Creio que entendi finalmente o que para Jung é Introversão e Extroversão. Nem tanto questão de ato, mais uma questão da forma como você pensa e processa as coisas.

Para o mal e para o bem, conceitos muito mais difíceis de definir do que os religiosos gostariam, estou condenado a mim mesmo. Estranho ter na cabeça o seu melhor amigo e também o seu pior inimigo. Mas a gente aprende.

Sei que hoje preciso estar atento. Tenho uma vida de tarefas e relações a levar ao longo do resto da manhã, da tarde e da noite. Sabendo que minha visão está mais turva pelo sentimento de mau-humor, um filho da tristeza e o pai da raiva, que hoje irá certamente me visitar, tenho que me controlar e me fixar em algo externo, em argumentos e um pouco de racionalidade e lógica.

O mais curioso de tudo é que nem todo mundo vê esse lado. Aprendi a ficar na minha, uma atitude não muito sociável, mas muito boa. Confortável, livre e sincera. Se não te interessa conversar com uma pessoa usando a moeda de troca da trivialidade, pra que começar? O silêncio, uma ótima invenção, no lugar do palavrório sem sentido. Irônico é que eu, na minha, levo sempre um livro, cheio de palavras.