Friday, November 27, 2015

Sobre Nós

Mesmo ela,
serena sobre nós,
senhora dos tempos
e regente dos amantes,
passará.

Será transitória um dia.

Saturday, November 21, 2015

Livros sobre o Japão - Eiji Yoshikawa



História é algo que sempre me interessou.  Gosto bastante de conhecer outros povos e uma forma de fazer isso, além de viajar, é ler romances históricos. A grande sacada desse tipo de livro é apresentar momentos da história sem a aridez dos livros didáticos. Mesmo quando os personagens não são pessoas reais, um bom livro desse gênero será sempre capaz de mostrar um recorte de um momento com fidelidade.

Um dos países que sempre me atraiu é o Japão, devido a sua cultura única. O Bushido, código de honra dos samurais, o zen budismo, que floresceu lá, a busca pela perfeição em tudo que fazem, o senso de coletividade. 

Então, quem quiser conhecer um pouco da história do Japão na perspectiva de um nativo, um dos grandes autores nipônicos é Eiji Yoshikawa. 

O grande mérito dele é saber mesclar fatos históricos com as lendas que cercam os personagens. Com isso ele consegue mostrar o espírito do Japão, demonstrando os valores desse povo tão diferente, de uma forma mais interessante para o leitor e sem ocidentalizar na análise o país, como faz James Clavell em seu famoso livro, Shogun. 

Li três grandes obras dele, que retratam um período marcante e que definiram a forma de ser do Japão a partir do século XII.

A primeira, O Heike, uma releitura de uma obra tradicional japonesa, conta a história da ascensão da classe dos samurais no país do meio para o final do século XII, especialmente a relação de disputa entre os clãs guerreiros dos Taira (Heike) e Minamoto (Genji).

Os Taira estabeleceram o primeiro governo militar do Japão, o que se tornaria recorrente até o século XIX. Após a rápida ascensão e queda desse clã, passaram a ser dominantes os Minamoto na fgura de Yoritomo, que iniciou a era dos Shogunatos, sistema feudal japonês com forte ênfase militar. 

O segundo livro, Taiko, conta a história de Toyotomi Hideyoshi, homem de origem simples e que pela astúcia e gênio militar se tornou senhor do país e o unificou no final do século XVI. Só não recebeu o título honorífico de Shogun por não ser de origem samurai. 

Hideyoshi se torna um ajudante de Oda Nobunaga, um dos grandes senhores feudais do Japão. Se destacando pela genialidade na capacidade de administração e na guerra, assim como pela lealdade, se torna um dos generais de Oda e depois da morte de seu senhor, o administrador do país.

Ieyasu Tokugawa, que se tornaria shogun após a morte de Hideyoshi, é também um importante personagem da obra.

O último livro, o mais famoso e provavelmente a obra prima de Eiji Yoshikawa é Musashi, a história do maior samurai do Japão e personagem emblemático de mesmo nome. 

A história começa nos idos de 1600, imediatamente após a batalha de Sekigahara, da qual saiu vitorioso Ieyasu Tokugawa, primeiro Shogun de uma dinastia que terminou somente em 1868, com a restauração Meiji, que abriu o Japão para o mundo moderno.

O livro mostra a trajetória de Myamoto Musashi, ao longo dos duelos que realizou com os maiores artistas marciais do Japão, sem nunca ser derrotado. Devido à sua superioridade em relação aos adversários, abandonou as katanas para lutar com espadas de treino de madeira. 

Seus méritos vão além da espada. Musashi se torna um homem em busca da perfeição e do autoconhecimento. O mais interessante é ver a evolução de Musashi, percebendo que a vitória, derrota e a própria vida são impermanentes. Vemos o caminho de um homem para tornar se grande, sua busca e dedicação para transcender.

Aliás, o grande tema dessas três grandes obras, talvez o mote da história do Japão feudal dos famosos Samurai e do Zen Budismo, é a impermanência de todas as coisas e as diferentes reações de pessoas à essa profunda verdade: todas as coisas passam.

Wednesday, November 11, 2015

Livro Saga Brasileira - Miriam Leitão

Num momento de discussões políticas acaloradas no Brasil, mas geralmente com pouco embasamento e opiniões de sobra, estudar o passado pode nos preparar melhor para conhecer verdadeiramente o presente e planejar melhor o futuro. Quando falamos em economia então, um tema aparentemente árido, o conhecimento é ainda mais importante, já que ela afeta diretamente nossa qualidade de vida, coisa que não costuma ser o centro da atenção de nossos políticos.

Com uma escrita simples e envolvente, o livro "Saga Brasileira", da jornalista Miriam Leitão, nos apresenta a história de nossa economia, com enfoque no período da ditadura e da grande enganação do dito "milagre", até os tempos atuais. Nas palavras dela, a obra narra a conquista do povo brasileiro de uma moeda estável e a grande batalha contra a inflação, derrotada mas ainda à espreita, sempre aguardando a próxima onda de ações populistas tão recorrentes aos governantes.

De forma clara e imparcial, ela relata as boas iniciativas feitas na nossa economia, sem se furtar a tecer críticas aos governantes do Brasil quando necessário. O livro é um grande alerta para a sociedade, um aviso dos riscos que corremos pela constante e repetida irresponsabilidade de nossos políticos.

Outro ponto constante destacado em nossa história, demonstrado em nomes e relatos de pessoas comuns, é a imensa obstinação, capacidade de adaptação e criatividade dos brasileiros para lidar e sobreviver a imensos desafios e dificuldades. 

Sunday, November 08, 2015

Fados, rock e mpb

Ele foi uma das pessoas mais interessantes que conheci. Passou rápido pela minha vida, mas posso dizer que foi um grande amigo.
Nasceu em Portugal e com seis anos foi para a França. Viveu na época das grandes bandas de rock e pode acompanhar, ao vivo, e cruzando o velho continente de trem, Led Zepellin, Rolling Stones e Deep Purple.
Me contou que, quando veio para o Brasil, queria estar em um lugar em que não bastaria parar numa estrada e esticar o braço para se transportar pra outra cidade ou país. Acho que ele tinha um impulso incontrolável que o fazia nunca fincar raízes, combinado, ai mesmo tempo, com um desejo de sim, ficar em algum lugar.
Com o tempo percebi que pessoas marcantes muitas vezes parecem incoerentes, paradoxais, aceitando em suas vidas essas aparentes contradições mas que apenas nos fazem ser mais humanos.
Seguindo a tradição lusitana, veio para o Brasil, ficando impressionada quando ouviu o Fado Tropical de Chico Buarque, para ele muito fiel ao estilo musical mais tradicional de Portugal. Acrescentou ao rock a música brasileira e suas variantes.
Fez sua vida aqui, se tornou naturalmente professor de Francês e depois se especializou em traduções de textos de psicanalíticos de Lacan.
O conheci, nos aproximamos pela música e pude ver em sua casa uma imensa coleção de cds variados, que ele foi me emprestando aos poucos, enquanto íamos conversando.
Sempre me chamou a atenção sua sinceridade, lealdade como amigo, espírito de liberdade e fidelidade a si mesmo, tudo sempre demonstrado com clareza. Tinha também aquela capacidade européia de ser simples e de olhar as pessoas pelo que elas são, gostando ou não, sem fazer  concessões.

Friday, November 06, 2015

Sabedoria

Pé no chão
Mão na massa
Mas a vista
Sempre voltada
Para o céu.

Thursday, November 05, 2015

O Trickster

Em algumas mitologias de índios americanos, quando as coisas estão calmas demais, entra em cena o Trickster ou Trapaceiro, um tipo de espírito brincalhão que tem por missão literalmente bagunçar um pouco as coisas. Seu objetivo é nobre, propagando um pouco de caos, ficam libertas as forças da criação, a inovação aprisionada no cotidiano.

Apesar do Trapaceiro se apresentar tradicionalmente como um Coiote, uma de suas habilidades é mudar de forma, se apresentando como animal ou ser humano, homem ou mulher, criando confusões para agitar acontecimentos e manter a dinâmica da vida.

Ele ensina que nada é garantido, que nada fica realmente parado, que o caos é vida e que devemos manter o bom humor mesmo no meio da confusão. Muita coisa aparentemente desconexa e louca que acontece pode ter o dedo desse sujeito que, por fim, quer que a gente não pare de criar coisas, fazer arte e rir um pouco. Talvez até rir da grande e séria dama soturna quando ela vier nos alcançar.

Passageiro

Certos pássaros não se acostumam a qualquer tipo de grilhão. Nem mesmo aceitam o pouso sobre os mesmos campos. Se ficam é temporário. Se ficam é por encantamento, por encontrarem algo que os maravilhe, que desperte, ainda que por um breve tempo, algo mais profundo. O encantador deve ser paciente para não assustar. Precisa demonstrar que poder voltar a algum lugar não é negar o voo ou a liberdade. Que aprofundar-se é só mais um aspecto da arte de voar e descobrir.Quando partem ficam umas poucas plumas, ou nem isso. O que fica é um aroma, um perfume no ar, suave pista mas que marca a memória como ferro em brasa. O tempo passa mas algo permanece, como se o tempo breve da permanência, exatamente por ser pouco, tendesse à eternidade. O que permanece é diferente do que era, transmutado, como se fosse mais diáfano e perdesse a tangibilidade por faltar o toque, o tato para lhe dar materialidade. È absorvido, sem ser uma saudade do que se foi, mas uma experiência que faz parte de quem se é. Certas coisas passam, mas ficam de alguma forma.Marcam e viram uma boa memória, divertida e grata, como se o famoso Trapaceiro, o Trickster dos índios americanos, com seus inúmeros disfarces, tivesse passado pela vida para te ensinar a voar um pouco.

Tuesday, November 03, 2015

Imagens - 1

Sempre me lembrarei daqueles olhos castanhos claros, me olhando com uma certa curiosidade, convidativos e desafiadores, bem próximos, pairando por um momento. Eu sabia que aquele era o momento. Era um resumo do que eu recentemente tinha descoberto.

A vida oferece, abre frentes e oportunidades, mas o último passo sempre precisa ser dado pela própria pessoa. Quem quer alguma coisa deve confessar sua própria vontade e ser capaz de alcançar aquilo que procura.

Eu poderia ficar ali, perder a hora e perder a garota. Mas eu já não era mais o mesmo e sabia que o sim ou o não dependiam de mim. Eu não imaginava o que viria, não havia futuro naquela hora, apenas o presente que trazia para mim uma mulher linda, mas que já era muito mais que isso.

O mundo tinha conspirado para aquele encontro, um curso de pós-graduação, meses depois um bar e por fim uma caminhada até o carro dela, que se transformou numa agradável conversa e nos levou aquele momento. 

A vida tem seus momentos decisivos. Momentos que mudam o rumo de uma vida. Momentos para os que parece que fomos preparados. Lá, na hora, eu não pensava em nada disso, só via aqueles olhos e estava feliz. E foi só o começo de muitas coisas maravilhosas que só uma vida a dois, dia após dia, pode oferecer.

Pois tudo começa e com o tempo se aprofunda, ganha substância e passa a ser parte de quem você é, te melhora como pessoa. E podemos nunca alcançar tudo, mas aquele que pode olhar para outra pessoa com amor, pode dizer que alcançou a completude. Quem sentiu isso em algum momento nunca mais é o mesmo.

Monday, November 02, 2015

Centro de BH

Há dois dias estava no centro de Belo Horizonte, num tradicional restaurante, a cantina do Lucas. São inegáveis as qualidades do lugar. Fica no Maleta, um prédio que faz parte da história da minha cidade. Tem uma comida realmente muito boa e a fundamental, indispensável, cerveja gelada.

Mais que isso, conta com a aura presente do senhor Olimpyo, um garçom que dedicou sua vida aquele lugar e que, do alto de seus noventa anos, fez questão de atender a mim, minha mãe e um casal de amigos, numa época em que ele não mais trabalhava.  Pra mim foi uma grande honra.

Mas o centro de Belo Horizonte é especialmente caro para mim devido a outra pessoa, fundamental em minha vida.

Pra mim, o Centro de BH sempre lembra minha avó, Dona Marina, com quem, quando criança, pude passear por todas as ruas desse lugar. Andei pela rua Tupis, pela avenida Amazonas, aprendi a amar o Mercado Central e sua diversidade, ouvi de noite o som da subida dos ônibus, amenizado pelos sete andares entre nós e a rua.

Foi lá que aguardei, ansioso, a meia-noite para a abertura dos presentes do natal. De lá pude observar a infinidade de apartamentos ao redor e ver nas ruas todos esses curiosos personagens que vivem  nos centros da cidade.

Pude adormecer enquanto minha avó lia salmos para mim. Mesmo que eu não tenha me tornado religioso, a tranquilidade daqueles versos bem lidos, cadenciados, me ensinou bastante sobre fé e paz.

Com minha vó aprendi a gostar das ruas, da vida diurna da cidade, das lojinhas de família e daquela confusão, ainda inocente e desprovida da atual violência, do caminhar frenético das pessoas. Aprendi a ver o potencial de beleza dos prédios do centro, desesperados por uma demão de tinta ou uma reforma que os restaure.

Se é do centro que parecem se desenvolver as cidades, foi de minha avó que se fez minha família, com seu pioneirismo e coragem de enfrentar a vida mesmo numa época de uma sociedade cruel com as mulheres.

Acredito que foi uma pequena revolução de uma pessoa contra as circunstâncias, mas que mudou a rota de nossa família e nos fez mais fortes, prontos para a vida.