Click. Apontou o revólver para minha cabeça, enquanto eu, distraído, estava sentado num banco. O banco, verde com pedaços enferrujados, estava apoiado no meio da grama, colocado ali provavelmente por engano, pois pertencia ao chão áspero de cimento. Mas aquele não era dia nem hora comum. À frente, depois do fim da grama e da faixa estreita do meio-fio, havia uma enorme avenida, começando da praça e seguindo reta em frente, como se fim não tivesse. Mas tinha fim, provavelmente no encontro entre as colinas e o céu, lá onde se formava o horizonte. Nem uma viva alma passava ali por perto, nenhum grupo fazendo cooper, grupo de piquenique ou grupo de amigos conversando. Eu, sentado, nada de posses e apenas um revólver pressionado contra a minha têmpora esquerda. Não estava incomodando, o cano pressionava só de leve a pele, dando espaço para que eu me virasse para ver o atacante. Eu não olhei. Um tiro só nem deve doer muito.
Daí eu lembrei. O sujeito com o revólver ia ficar sem graça e me julgar mal educado caso eu não olhasse. Me ensinaram a ter respeito pelas pessoas ai fiquei imaginando: o cara matar alguém sem nem olhar no olho? Combatendo a preguiça, fui virando minha cabeça devagar. O cano da arma encontrou abrigo na minha testa, como se tivesse sido desenhado para aquela posição.
Havia algo de familiar no rosto. Os traços, um tanto grossos e um sorriso de dentes pontudos, meio insano. Os olhos, profundos, que só se revelavam verdes a um segundo olhar. O rosto, grande, complementando a cabeça arredondada. O cabelo, curto. Era eu, igual, mas diferente. Apertou o gatilho, a cápsula deflagrada adentrou meu pensamento, que se avermelhou. Um golpe seco, o corpo caindo para o lado, caindo sobre o banco para terminar no chão.
Descarreguei as cinco balas restantes do .38 no corpo. Puro capricho. Exagero estético. Eu só queria. Estranho se ver no chão, morto, sem céu, sem nada. Sem alma fugindo pelos olhos. Um pé depois do outro, fui andando para a avenida. O revólver já era inútil, joguei fora.
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