Thursday, April 27, 2006

Burnout

ou esgotamento existencial.

Cansei de mim, como quem se cansa de respirar num quarto sem janelas nem portas, com quatro paredes brancas e abafadas. O branco permite que tudo, como se fosse tela, seja imaginado e projetado. Mas e o real? Perde-se, sempre lá fora. O lá fora termina por ser imaginado apenas, faltando-lhe substância e vivência. As lutas acontecem no ringue e não nos vestiários ou na confecção das luvas do boxeador.

Cansei de mim pois busco o outro. Jung diz que existem dois tipos básicos de pessoas, aquelas introvertidas e as extrovertidas. Esses dois tipos básicos se conjugam com quatro características - pensamento, sentimento, intuição e sensação. O desenvolvimento rumo ao Self, a individuação, tende a equilibrar essas funções, apesar de, na raiz, sempre termos um lado predominante.

O extrovertido é aquele que corre para o objeto de seu desejo, sem ter uma relação de conhecimento ampla de sua paisagem interior. O introvertido olha para o objeto e o reveste de uma capa, algo que ele projeta sobre esse objeto.

Pelo desconhecimento, o Extrovertido que mergulha em si mesmo encontra terreno virgem, não experimentado, recebendo esse "interior" de forma positiva e com certa inocência. Com o Introvertido, quando entra no mundo exterior, acontece algo semelhante: o mundo de fora é belo, novo e sem vícios.

Talvez por isso eu nunca tenha deixado de ter fé nas pessoas, por mais ameaçador e difícil que eu considere esse tal "outro". Talvez por isso eu tenha resolvido criar uma janela e uma porta, com sangue, nesse quarto fechado. Eu nunca ouço ninguém, por fim. Se ouço é por preguiça, passividade e conveniência. Eu não costumo olhar para fora, como se o mundo fosse quase minha criação e tivesse que ter as minhas regras.

O que acontece quando se descobre que você não é bonzinho, ou justo? Eu rio. Rio por desvelar um mistério, rio de ter encarado a minha sombra, rio por ver além da névoa. Rio por confirmar o que eu sempre achei ridículo no cristianismo: que a dor ensina, que olhar para o outro é a salvação para o si mesmo e que esse outro, para além do ego, é a totalidade do ser. Isso é o que chamam Deus, sem saber: a vivência do Ser, a experiência mística, individual e intransferível, que a ignorância transforma em dogma religioso. A ignorância e a covardia, o niilismo que nega a vida, como diz Nietszche.

O caminho para o Self é de transformação, de alquimia, de desvelamento, de inacabamento, de dissolução, de coragem perante a destruição. Da formação de um terceiro elemento, inesperado.

O que se aprende quando se percebe que só uma pessoa não basta? Que sim, uma pessoa consegue bastar a si mesma, ser autônoma completamente, pois por fim ninguém precisa de ninguém. Mas que vida pobre essa, pautada por mera necessidade, por mero "precisar de alguém". Tanto quem precisa quanto quem não precisa tem uma vida pobre.

Ninguém precisa de ninguém. Portanto muito, muito mais que precisar, melhor é querer caminhar com o outro, ter isso por desejo e afinidade.

No comments: